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Godard e mais dois em 3D

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3 x 3 D passou na Mostra e agora entra em circuito. Republico o texto que escrevi na ocasião.

 

O filme contém um nome mágico para os cinéfilos – Godard. Sim, Jean-Luc Godard, o mais inventivo dos cineastas da nouvelle vague é um dos autores de 3 x 3D, tríptico formado por ele, o britânico Peter Greenaway e o português Edgard Pêra. O filme, experiência em 3D, foi feito com apoio financeiro do evento Guimarães – Capital Europeia da Cultura.

Não deixa de ser significativo. A Europa, assolada por uma devastação econômica que data desde 2008, aposta na cultura como remédio. E aposta bem, mesmo porque o país mais atingido de todos, a Grécia, é simplesmente o berço da cultura ocidental. Godard disse um dia desses, com razão, que se tivessem de pagar royalties à Grécia por tudo que ela legou ao mundo – da filosofia ao léxico – ela estaria nadando em dinheiro.

Enfim, voltando ao filme: Greenaway talvez seja o que use com mais intensidade o recurso do 3D, o que não quer dizer que seu episódio seja o melhor. Mas é belíssimo como plano sequência que desvenda os corredores do Paço dos Duques enquanto apresenta personagens de várias épocas da história portuguesa. A sensação tridimensional é intensa mas, como em outros trabalhos do diretor, também passa uma sensação de vazio esteticista.

Já o português Edgard Pêra ocupa de forma humorística o seu espaço, discutindo a relação do cinema com a seu público, a partir de um evento emblemático – o pânico causado pela locomotiva que parecia avançar sobre o público numa exibição dos Lumière. As pessoas não sabiam o que era o cinema e reagiam dessa forma ingênua. Hoje, já nascemos no mundo do audiovisual. Que novidades nos espantariam quando projetadas sobre uma tela. Haverá ainda o novo? São questão pendentes desse segmento, um tanto extenso demais para o que tinha a mostrar.

Chega-se, por fim, a Godard que, com um conjunto de imagens próprias e outras recolhidas de diversas fontes, (re)coloca a questão da representação do real, proposta pelo cinema e pelas outras artes. São imagens fortes, desde algumas do Holocausto até outras tiradas de pinturas rupestres da caverna de Chauvet. Cabeças de cavalos que dão a ilusão do movimento e que foram interpretadas por Werner Herzog (em A Caverna dos Sonhos Esquecidos) como uma espécie de protocinema. Nossos antepassados já saberiam criar a ilusão do movimento, truque através do qual o cinema foi inventado?

Nesse “texto cinematográfico” de Godard esta e outras questões estão imbricadas. Uma remetendo à outra. Por exemplo, na era da hiper representação nos acercamos ou nos distanciamos do real? Como recriar o antigo poder das imagens, quando delas andamos saturados?

Godard propõe esse raro trabalho de pensamento, completamente inusual no cinema contemporâneo que, com raras exceções, tende à acefalia. Na saída da lotada sessão do Cinesesc, uma espectadora se queixava de que Godard não havia utilizado bem o 3D. É que, na verdade, ele propõe, com relativista, uma quarta dimensão neste segmento de filme, que se comenta e se indaga o tempo todo. Talvez haja apenas Godard como representante de uma estirpe que usa o cinema como forma de pensamento. Filma com olho de filósofo.


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